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Evadir-se

domingo, 25 de janeiro de 2009



Ver o mundo de outro ângulo. Por que não? Nem que seja literalmente. Certo dia estava tomando de conta do mercadinho do meu pai. Começou a chover. Era uma chuva de verão, passageira, no final da tarde, num dia de semana. Não demorou muito pra que alguns pedestres se aglomerassem na calçada guardada da chuva. Uma garota me chamou a atenção. Ela parecia cansada. Ficou agachada no batente, assim de cócoras mesmo. Sua roupa molhada. Sua pele talvez macia e gelada. Secando. Apoiou o queixo nas mãos. Cotovelos nos joelhos. Parecia pensativa. O que se passava nos seus pensamentos? Via o tempo passar. A chuva diminuir até uma fina garoa. O sol reaparecer sem aquecer o gelo. Anota um refrigerante, por favor! Ok. Ela foi embora. Ou melhor, em má hora. Nem percebi. Evaporou como o espelho d'água que havia se formado no asfalto. Instantaneamente. Incrível. Eu nasci nessa casa. Sempre pensei que conhecia tudo daqui. Todos as horas. Todas as formalidades do tempo. Mas eu via tudo de pé. Impaciente. Com sol. Ou com muita chuva. Mas sem transição. Sem sentir na pele. Sem pensar muito. Sem sentir. Sem me deixar evadir. Enfim, sem ver o mundo de outro ângulo.