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No Cariri se fala assim

sábado, 18 de setembro de 2010



É uma tortura para o caririense pronunciar o nome da novela das 7 em terras alencarinas. A telenovela global se chama Ti-ti-ti. Como bom regionalista do Cariri, eu não me rendo à forma chiada de falar dos fortalezenses ou da grande maioria das cidades do Brasil. Quase todo mundo diz, foneticamente, "Tchi-Tchi-Tchi". Os sertanejos falam é "Ti-Ti-Ti" mesmo, sem o som de 'x' ou de 'ch' entre o 't' e o 'i'.
Se me recordo bem, na escola, a professora ensinava as sílabas de uma maneira que deve ser universal no abecedário do português. Aquela simpática "tia", ou melhor, professora, ensinava: “T com A, Tá; T com E, Té; T com I, ; T com O, Tó; T com U, Tú.” Não me recordo dela ensinar o “T com I, Tchí”. Senão essas sílabas seriam, grosso modo, “T com A, Tchá; T com E, Tché; T com I, Tchí...” E por aí vai.
Não sei de onde vem essa forma de pronúncia, mas fico intrigado igualmente com as diferentes formas de se comunicar nesse país. Explica-se, penso, pelo fato deste ser continental e ter extraordinárias diferenças culturais e sociais. Herança, pois, de dominação. Nos telejornais ou nas músicas de alcance nacional, a linguagem é padrão, claro. Mas mesmo assim, apesar de todo o contato com o jeito de falar vendido nas mídias, continuamos a falar do mesmo modo que herdamos do nosso meio, a menos que você queira perder sua identidade natal.
Para dizer alguma coisa, o fortalezense fala: “Dêxa eu tchi djizê, macho”. O caririense da nata diz: “Dêxeu ti dizer, bicho”.
O modo de falar é uma marca constante em cada comunidade. No Cariri, falamos “”, na capital, fala-se “Tchí”. Mudando de lugar, nos pampas se fala “tu queres” e em Pernambuco recriam esse linguajar, mais conciso, apressado e arrastado no emprego do 's'. Cada canto tem a sua gramática. Questão de identidade. É fácil reconhecer esses estereótipos. O cearense, o pernambucano, o carioca, o gaúcho e, claro, o baiano, têm todos uma pronúncia inconfundível. Ainda mais se forem ditas as gírias. Se alguém diz “Égua, macho!”, você já mata de onde é. Se você sabe, é fácil confirmar que o “tri legal” vem de mais longe.
Aqui em Fortaleza, se alguém me conhece em um minuto de conversa, já diz: “E tu é ‘di’ Crato?” Eu não acharia ruim a ironia, mas corrijo o erro geográfico: “Sô é di Juazeiro do Norte, cabra!”.
Relembrando que, até no inglês, para reafirmar minha teoria do "Tí", a palavra "teacher" é pronunciada como "Títchâr", não "Tchitchâr". 2 a 0 pro Cariri!
Saúdo, enfim, o grande artista nordestino, conhecido nacionalmente, Zé Ramalho, que em suas músicas canta a vida do sertanejo sem maquiar seu linguajar. Canta ele: “vida di gado, povo marcado, povo feliz”.
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