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Um homem e seu Carnaval

terça-feira, 8 de março de 2011


Muitos já falaram de carnaval. Vou parafrasear Luiz Melodia, quando escutei sua evocação num antigo disco acústico dos Titãs: "Carnaval, carnaval, carnaval... Eu fico triste quando chega o carnaval."

E sobre carnaval, assim escreveu Drummond, no poema que dá título a esse post.

Deus me abandonou
no meio da orgia
entre uma baiana e uma egípcia.
Estou perdido.
Sem olhos, sem boca
sem dimensões.
As fitas, as cores, os barulhos
passam por mim de raspão.
Pobre poesia.

O pandeiro bate
é dentro do peito
mas ninguém percebe.
Estou lívido, gago.

Eternas namoradas
riem para mim
demonstrando seus corpos,
os dentes.
Impossível perdoá-las,
sequer esquecê-las.

Deus me abandonou 
no meio do rio.
Estou me afogando
peixes sulfúreos
ondas de éter

curvas curvas curvas
bandeiras de préstilos
pneus silenciosos
grandes abraços largos espaços
eternamente.

* A obra acima se chama Carnaval em Madureira (1924), de Tarsila do Amaral.